sábado, 10 de janeiro de 2009

Laranja Mecânica


Laranja Mecânica
A Clockwork Orange
Reino Unido, 1971
Drama/Ficção-Científica

Direção: Stanley Kubrick

Roteiro: Stanley Kubrick, baseado no livro de Anthony Burgess

Elenco: Malcolm McDowell, Patrick Magee, Michael Bates, Warren Clarke, Adrienne Corri, Carl Duering

Há certos filmes que marcam época e dividem opiniões. Você pode amá-los ou odiá-los, mas sempre terá algo a dizer sobre eles. Não há como ficar neutro. Laranja mecânica é um deles. Confesso que antes de assistir ao filme eu não havia ouvido nenhuma crítica positiva sobre ele. Sempre me diziam que ele era "violento demais", "exagerado" ou "irreal". Talvez porque as pessoas com quem falei buscassem sempre nos filmes aventura, romance, humor leve, histórias bonitas com finais felizes. Coisas essas que nem passam perto de Laranja Mecânica. Pelo menos não em sua forma clássica e eternizada.
O enredo se passa na Inglaterra, em 1995. O anti-herói Alex DeLarge (Malcolm McDowell), um jovem de 18 anos, fã de Beethoven, e que é líder de uma gangue de delinqüentes viciados em drogas e que se divertem batendo, estuprando e matando. É a chamada ultraviolência que nos é apresentada. Um dia, traído pelos seus comparsas, Alex é capturado pela polícia. Após um tempo preso, ele aceita se submeter a um tratamento novo de reabilitação, que promete transformar criminosos em cidadãos honestos. Porém, o método é cruel, radical, brutal, e não somente torna Alex incapaz de violentar alguém, como também o torna indefeso a qualquer violência que possa sofrer. Nesse momento, somos colocados diante da questão de qual ato é mais reprovável: o do criminoso que se diverte com suas barbaridades ou o da sociedade, sob a forma de seu governo controlador, que o torna indefeso e o faz sentir na pele um pouco de sua ultraviolência? É inquietante. O filme todo o é.
A história inteira é mostrado por extremos. Não há meias palavras, tudo é apresentado de forma direta e intensa. Justamente por isso não digo que é um filme totalmente agradável de ser visto. É muito forte, e passa para o espectador exatamente o que o protagonista sente. Alex muitas vezes se sente nauseado e enjoado e isso acaba sendo transferido para quem assiste. Há também muitas cenas de violência e sexo, que fizeram com que o filme recebesse pesadas críticas por abusar disso. O diretor Stanley Kubrick, inclusive, mandou que o filme fosse retirado de cartaz no Reino Unido por ter recebido muitas críticas desse tipo. Ele disse que o filme só seria exibido lá após sua morte, que ocorreu em 1999.
Kubrick dá ao filme a sua cara. Cenários sempre exageradamente ornamentados, coloridos, futuristas, excêntricos. Também os figurinos. As gangues usam uniformes que mais parecem fantasias de Carnaval. Cartolas, bengalas e o famoso cílio postiço utilizado por Alex são elementos característicos. Nas atuações também percebemos esse tom alegórico de Kubrick. Muitas delas chegam a ser caricatas, como a do diretor do presídio (Michael Glover), sempre exageradamente formal, gritando mesmo quando desnecessário e tratando os presos como seres inferiores. Uma crítica à polícia e ao sistema prisional britânicos.
Malcolm McDowell é outra figura sem a qual o filme não existiria. E quem disse isso foi próprio Kubrick, afirmando que se McDowell não houvesse aceitado o papel, provavelmente não teria dirigido Laranja Mecânica. McDowell interpreta perfeitamente a crueldade de Alex. Em muitas cenas ele trabalha apenas com o olhar, tendo que demonstrar frieza ou fúria sem nada dizer. Também explora bastante a linguagem corporal, com muitos gestos característicos, além do modo de falar, do qual tratarei mais adiante. Sem falar que McDowell teve de encarar algumas situações no mínimo incômodas nesse filme. A clássica cena em que ele usa um utensílio que o impede de fechar os olhos enquanto assiste a várias filmes de violência é perturbadora até para quem vê, quanto mais para ele. Outra situação inusitada é que Kubrick só incluiu a cobra de estimação de Alex nas filmagens depois que soube que McDowell tinha medo de cobras.
Um detalhe característico e que contribuiu para que o filme se tornasse um ícone dos anos 70 é a linguagem que apresenta. Vocábulos como droog (do russo druk, amigo) e moloko (leite) são muito comuns no filme. Alex utiliza muito o "Nadsat", um vocabulário criado pelo autor do livro, Anthony Burgess, que mistura o russo e o cockney, que é o linguajar usado pela classe operária britânica. O autor inspirou-se em duas tribos urbanas rivais da Inglaterra, os Mods e os Rockcers, na criação desse vocabulário.
Laranja Mecânica concorreu ao Oscar em quatro categorias (Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Roteiro Adaptado e Melhor Edição) e ao Globo de Ouro em três categorias (Melhor Filme em Drama, Melhor Diretor e Melhor Ator em Drama para Malcolm McDowell). Isso com um orçamento de apenas 2 milhões de dólares, o que prova que não há dinheiro que substitua o talento, principalmente hoje em que vemos orçamentos de 100, 150 milhões resultarem em filmes sem conteúdo.
A característica do filme que causa repulsa a alguns, qual seja ser diferente do que estão acostumados a ver, é também a que encanta muitos outros. O filme é simplesmente diferente de tudo que já foi visto no cinema. É difícil achar um par para Laranja Mecânica. É único. Bom ou ruim, é único.

3 comentários:

Contra a Maré disse...

Excelente!

Maria Clara Aragão disse...

Deve ser mesmo pesado pra caramba, a critica ta muito boa. (yn)' parabens Leo;

Unknown disse...

"Vocábulos como droog (do russo druk, amigo)" corrigindo, é do russo "drug". (:

 
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