sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Harry Potter e as Relíquias da Morte - Parte 1

Por Juliano Gadelha



Harry Potter e as Relíquias da Morte - Parte 1

Harry Potter and the Deathly Hallows - Part 1
EUA / Inglaterra , 2010 - 146 min.
Drama / Fantasia / Suspense

Direção: David Yates

Roteiro: Steve Kloves

Elenco: Daniel Radcliffe, Emma Watson, Rupert Grint, Ralph Fiennes, Helena Bonham Carter, Bill Nighy, Richard Griffiths, Harry Melling, Julie Walters, Bonnie Wright, Fiona Shaw, Alan Rickman, Carolyn Pickles, Toby Jones, Robbie Coltrane, Brendan Gleeson, James Phelps, Oliver Phelps, Mark Williams, George Harris, Andy Linden, Mundungus Fletcher, Domhnall Gleeson, Clémence Poésy, Natalia Tena, Evanna Lynch, Rhys Ifans, Matthew Lewis, David Thewlis, John Hurt

Nove anos se passaram desde o lançamento de Harry Potter e a Pedra Filosofal, o primeiro da mais lucrativa série cinematográfica da história. Como toda adaptação de livro para o cinema, os filmes não agradaram a todos, e aliás, desagradaram a muitos, especialmente aos fãs. Sempre ficava aquela pergunta: porque os filmes de Harry Potter não saem tão bons quanto os de O Senhor dos Anéis? Mesmo nos melhores filmes da saga, parecia que faltava alguma coisa. Ainda assim, o sétimo filme, Harry Potter e as Relíquias da Morte - Parte 1, o início do fim, veio prometendo mudar essa história. Será que conseguiu?
No penúltimo episódio da saga de Harry, o enredo é bem singular em relação aos anteriores. Para começar, nada de Hogwarts. Harry (Daniel Radcliffe) não volta à escola que frequentou durante seis anos e que durante esse tempo considerou seu verdadeiro lar. Agora ele enfrenta o "mundo real" e se vê cada vez mais exposto e indefeso enquanto o poder de Lord Voldemort (Ralph Fiennes) não para de crescer. O cerco se fecha em torno dele e de seus fiéis amigos Rony (Rupert Grint) e Hermione (Emma Watson), e também de todos aqueles que o tomaram como estandarte na guerra contra "aquele-que-não-deve-ser-nomeado". "Harry é a única esperança que temos. Confiem nele". E parece que toda essa responsabilidade, que durante muito tempo lhe foi um peso inconveniente, agora já é aceita naturalmente por Harry, apesar de muitas vezes ele simplesmente não saber o que deve fazer. Toda essa mudança em relação aos outros filmes é o tão aguardado clímax final da série. Na verdade, se trata ainda de um pré-clímax, pois a parte 1 está, do início ao fim, nos preparando para parte 2.
Desde o Prisioneiro de Azkaban, a crítica (fomentada pelo marketing dos filmes, diga-se de passagem) tem divulgado um "Harry Potter mais sombrio", usando manchetes como "Harry não é mais criança" ou "o bruxinho cresceu", como se a série inteira devesse se ater ao clima mais infantil dos primeiros filmes. O tempo passou e tais manchetes se repetiam filme após filme. Mas sombrio de verdade é esse sétimo filme. Harry, Rony e Hermione nunca enfrentaram perigos tão intensos e nunca vivenciaram situações tão críticas como agora. Eles estão sendo postos à prova como pessoas, como bruxos e como amigos.
Entretanto, esse clima sombrio poderia ter sido intensificado. A conjuntura pede isso, o momento pede isso. Em algumas cenas, quando se espera uma explosão dramática dos personagens, o máximo que se tem é um silêncio constrangedor, um rosto vazio, olhares para o nada. Mais do mesmo. Isso já foi visto, e bastante, nos anteriores. Esse filme teve a oportunidade de se destacar ainda mais dos outros. Faltou radicalizar um pouco, explorar a emoção dos atores, fazer cenas realmente à flor da pele. Às vezes isso ocorre por deficiência do ator, mas muitas vezes é falha no roteiro mesmo, que não exige deles um pouco mais na cena. Oportunidades não faltaram. Ao longo do filme, várias cenas poderiam ter sido mais bem exploradas visando dar ao filme um ar de verdadeiro filme de drama.
Há, é claro, momentos emocionantes, mas também há momentos bobos, tolos demais para pertencer a um filme de teor dramático tão profundo. Assim como em A Ordem da Fênix e O Enigma do Príncipe, também de David Yates, há muitas cenas de humor forçado, neste menos que nos outros, mas que destoam ainda mais devido à constante sensação de perigo que abate os personagens.
O filme começa bastante corrido. A primeira hora segue um ritmo alucinante, até atropelado, deixando algumas passagens mal explicadas ou mesmo sem explicação. Quem não leu o livro vai ficar um pouco perdido. Depois, o filme dá uma enorme desacelerada e começa a se arrastar, sem lutas, sem cenas exaltadas. Os personagens analisam sua situação e pensam no que virá a seguir. Muitos vão considerar essa parte do filme bastante chata. Mas ela foi, na verdade, muito benéfica para o filme, pois conseguiu captar perfeitamente o momento pelo qual os personagens estavam passando. Nessa fase, há uma cena bastante interessante. Ouvimos o rádio, e o locutor lista os nomes dos desaparecidos, enquanto acompanhamos os três amigos perambulando, aparatando e desaparatando de um lugar para o outro, meio perdidos, sem saber para onde ir. Quem vê essa cena isolada nunca imaginará que se trata de um filme de Harry Potter. Mais parece um filme de guerra em que as pessoas aguardam, ansiosas, notícias de seus familiares. Essa é a intenção, e o resultado foi ótimo. Depois dessa pausa, o filme volta a ganhar ritmo, e o suspense e a ação tomam conta até o momento final.
Essa continuação sofre por erros cometidos nos anteriores. Muitos fatos importantes foram deixados de lado nos outros filmes, e tiveram de ser colocados às pressas neste, que já está abarrotado de informações. Mais uma vez quem não leu o livro vai ficar um pouco perdido. O prejuízo foi inevitável, mas a desgraça era anunciada. É claro que muita coisa ainda pode ser explicada na parte 2. Aliás, muito tem de ser explicado na parte 2, do contrário o filme estaria apenas soltando informações à toa sem maiores cuidados com a verossimilhança e com alógica do enredo. Aguardemos.
A atuação do trio de protagonistas não tem nada de novo. Daniel Radcliffe, como sempre, está apenas razoável. Mas, mesmo assim, o personagem parece estar tão intimamente ligado a ele, que seja lá o que o ator faça, ele parece bastante convincente como Harry. Rupert Grint é um pouco melhor que ele, e aparenta levar mais jeito como ator. Emma Watson já provou ser melhor que os dois, e, apesar de estar presa aos cacoetes da sua personagem, tem uma carreira promissora. Destaque para as curtas mas sempre valiosas participações de Ralph Fiennes, Alan Rickman, Jason Isaacs e Helena Bonham Carter.
A parte visual, como de costume, está impecável. O elfo doméstico Monstro está excelente, apesar de ter havido um certo retrocesso com relação a Dobby, comparado com o de Harry Potter e a Câmara Secreta. Destaque também para a excelente animação do "Conto dos Três Irmãos". A fotografia ficou a cargo do competentíssimo Eduardo Serra, que não decepcionou. Faltou um pouco de força e vigor à trilha sonora de Alexandre Desplat, e os famosos temas de John Williams fizeram falta. A boa notícia é que o compositor norte-americano retorna na parte 2.
Harry Potter e as Relíquias da Morte - Parte 1 segue a tradição da série de faturar alto. Foram cerca de US$ 330 milhões no fim de semana de estréia ao redor do mundo, recorde da franquia. Mas o filme, em si, rompe com os outros em questão de estilo. Inevitável, pois a trama exige esse rompimento. Mas percebe-se uma certa resistência com relação a essa mudança natural, uma tentativa de incluir elementos dos anteriores nesse, o que foi bastante prejudicial. Mas isso não macula por completo o filme, que ainda assim é um dos melhores da série, graças à riqueza da trama, tão intensa e profunda, créditos que devem ser dados à obra que serviu de inspiração. Entretanto, permanece o sentimento de que Harry Potter pode mostrar mais nos cinemas. O sonho dos fãs de ver essa obra-prima da literatura transformada em uma obra-prima do cinema ainda não acabou. Resta uma chance. Será que agora vai?

 
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